A última quarta-feira (4) foi um dia especial na carreira de Bill Van Zyll. Há dezessete anos à frente da operação da Nintendo para a América Latina, o executivo de origem holandesa comemorou no Brasil o que ele chama de “dois marcos”. O primeiro é o lançamento do novo console da empresa japonesa, o Nintendo Switch 2, simultaneamente aos principais mercados internacionais. Historicamente, é a primeira vez em quase 30 anos que o País recebe um novo console Nintendo no mesmo dia em que os Estados Unidos — a última foi com o Nintendo 64, em 1996, quando a marca ainda era representada pela Gradiente.
O segundo marco é a chegada de novas versões para Switch 2 dos jogos The Legend of Zelda: Breath of the Wild (2017) e Tears of the Kingdom (2023), ambos com suporte a legendas em português brasileiro. “É uma grande conquista”, ele afirma. “Que eu saiba, esta é a primeira vez em que a Nintendo retornou a um jogo antigo para fazer esse tipo de patch.”
Durante o evento de lançamento do Switch 2, em São Paulo, o onipresente General Manager (e recém-promovido a VP) conversou com o The Gaming Era sobre os controversos preços cobrados pelo novo console e seu principal título, Mario Kart World (R$ 4500 e R$ 500, respectivamente), além de dar pistas de estratégias futuras para expandir o market share da Nintendo no mercado nacional.
The Gaming Era: Quero começar falando sobre a pré-venda do Switch 2 que aconteceu no Brasil. Os consumidores esperavam que as entregas começassem na próxima segunda, 10 de junho, mas ontem (3), receberam e-mails informando que receberão o Switch 2 antes do previsto, na sexta, 6 de junho. Como a Nintendo está lidando com a demanda do novo produto fora dos EUA? Acham que conseguirão atender à demanda dos brasileiros?
Bill Van Zyll: Nós certamente esperamos atender à demanda do consumidor brasileiro. A demanda tem sido enorme. Nos EUA, esgotamos o estoque em tempo recorde. Os sistemas de dois dos principais varejistas travaram, o que nunca havia acontecido antes com eles.
Você viu que o Sr. Furukawa [presidente da Nintendo do Japão] veio a público e pediu desculpas aos consumidores, depois que abrimos o sorteio para o Nintendo Switch 2 e eles perceberam que não havia como mais de duas milhões de pessoas conseguirem participar, pois seria impossível atender a toda essa demanda.
Aqui no Brasil, tivemos a pré-venda com Amazon, Mercado Livre e Kabum, e também esgotamos em tempo recorde. Então, a demanda tem sido muito forte. Temos limitações quanto à quantidade de produto que estará disponível.
Portanto, prevemos que haverá falta de estoque e tentaremos lidar com isso o mais rápido e da melhor forma possível. Mas esperamos conseguir alcançar o maior número possível de consumidores aqui no Brasil com o Switch 2.
TGE: O que você pode dizer sobre as expectativas de vendas no Brasil para os próximos 12 meses e qual foi o tamanho da demanda aqui? Tem números para compartilhar?
Van Zyll: Então, provavelmente a melhor referência que você pode consultar são as informações de market share da [empresa de consultoria] GFK que estão disponíveis sobre a indústria. E o que vemos é que ainda há muitas oportunidades de crescimento para o Brasil.
Na nossa visão, o potencial que queremos alcançar é o tipo de market share que temos no México. Basicamente, nós partimos de zero no Brasil e, em questão de quatro anos, chegamos a cerca de 15% de participação de mercado. No México, nos últimos dois anos, atingimos a casa dos 40%.
Isso pode lhe dar uma indicação do potencial do País, e é o que pretendemos alcançar a longo prazo. E isso não é necessariamente conquistando market share dos outros, e sim que esperamos aumentar o mercado e a nossa participação de mercado, ambos juntos.

Porque, como você bem sabe, já que está nessa há bastante tempo… Para os gamers, não é uma questão de “ou”, mas sim de “e também”. Eles podem até ter outra plataforma, seja PC ou outro console, mas ainda assim vão optar por um Switch para jogar games de franquias como Zelda.
O que eu acrescentaria é: estamos apresentando o Nintendo Switch 2 agora, mas ainda vemos um enorme potencial para o Switch 1. Porque há tantos gamers que ainda não alcançamos, e pensamos que, para os consumidores que estão entrando agora no “mundo da Nintendo”, o Switch também é uma ótima opção.
Tem um preço mais acessível, e quem é novo encontra, de cara, 15 mil jogos disponíveis na plataforma — todos esses títulos são “novos” para quem está começando agora.
TGE: É notório que a carga tributária brasileira continua a ter um impacto significativo nos videogames em geral, não apenas os da Nintendo. Além disso, outros fatores, como flutuações cambiais e até as tarifas do Trump, acabam influenciando os preços finais por aqui. Quais estratégias vocês adotaram para lidar com esse desafio local, somado às coisas que vêm acontecendo no mundo?
Van Zyll: Sim, é uma pergunta justa. Muita gente está falando sobre preços, e não é só no Brasil. Nesse momento, a conversa também acontece nos EUA. Você mencionou as tarifas. Bem, essas são grandes questões para nós — impostos, tarifas, taxas — e também são no Brasil. Mas nosso objetivo é atingir o maior número possível de consumidores.
Então, tivemos como ponto de partida tentar obter um preço o mais justo possível para exportação e importação para o Brasil. As partes que não controlamos são muitas dessas que você citou. Há todos os impostos e taxas que se acumulam ao longo de todo o processo.
Tem os custos logísticos, os de importação e, em seguida, o deslocamento dos produtos no País. Tem também toda a distribuição e toda a cadeia de varejo pela qual os produtos passam. E tudo isso tem um impacto no custo.
São coisas que tentamos gerenciar da melhor forma possível, mas que, no final das contas, não podemos controlar.
E esses são os principais fatores que elevam os preços no País. E não acho que o Switch 1 e o Switch 2 sejam exclusivos desses desafios. É algo que qualquer produto, especialmente os de custo mais alto, “sofrem”, por assim dizer, no Brasil.
TGE: Você frequentemente enfatiza que o Brasil é uma prioridade estratégica da Nintendo quando se trata de crescimento orgânico. Como lidar com o desafio da acessibilidade dos produtos, considerando a realidade econômica enfrentada pela maioria dos brasileiros?
Van Zyll: Então, é uma questão de focar no que se pode controlar. Veja o que aconteceu com o Nintendo Switch: quando o lançamos por aqui [em 2020], ele tinha um preço mais alto. Com o tempo, conseguimos diminuir, e um grande impulsionador para isso foram algumas das decisões do governo de reduzir taxas e impostos.
Nem todos os impostos desapareceram [risos]. Ainda há muitos que se aplicam, mas alguns ajustes foram feitos. Nós repassamos essas coisas ao consumidor e conseguimos ajustar os preços de acordo.
Estamos sempre olhando as variáveis e buscando oportunidades para tornar nossos produtos acessíveis. Quando se trata do hardware e de tudo o que envolve sua produção, há uma quantidade limitada de coisas que podemos fazer para reduzir esse custo. Ele precisa “se pagar” sozinho.
Então, onde encontramos oportunidades para ter um preço mais justo é no software.
Se você olhar para os preços do software e compará-los com os preços em outros mercados, verá que todas essas taxas, impostos e custos diferentes não estão totalmente incluídos. Os preços não estão muito distantes do que você pode encontrar nos Estados Unidos.
Então, novamente, estamos sempre analisando quais fatores ou em quais áreas podemos ajustar e controlar e, finalmente, reduzir esse preço para o consumidor brasileiro.
TGE: Talvez nunca na história da Nintendo a discussão sobre preços superou a expectativa em relação aos jogos, como está sendo agora. Mas vocês justificaram suas razões: [o presidente da Nintendo of America] Doug Bowser deu entrevistas mencionando os altos custos de produção, as tarifas e até mesmo o escopo maior de jogos como Mario Kart World. Mas conversei com veteranos da indústria, que alegaram que os games eram ainda mais caros antigamente, convertidos os preços pela inflação. Aparentemente, os preços já poderiam ter subido, mas subiram agora. Era inevitável? Por que agora e não antes?
Van Zyll: Bem, com certeza estamos em um momento importante, em que temos uma nova plataforma chegando. Obviamente, há vários custos associados a uma nova plataforma que, de certa forma, precisam se pagar, ou esse não seria um modelo de negócio sustentável.
Então, acho que isso realmente se resume a dar um passo para trás e entender quais são esses custos. E como você mencionou, há muitas variáveis que influenciam a decisão, que Doug Bowser já fez grande parte do trabalho de explicar.
Mas a questão dos custos de desenvolvimento está nas manchetes das notícias. É algo que afeta toda a indústria. Há muitas empresas de desenvolvimento que estão enfrentando enormes desafios e demissões.
Quer dizer, se você olhar para a indústria como um todo, o que está acontecendo é porque os custos associados ao desenvolvimento dos jogos não têm sido refletidos adequadamente no custo dos próprios jogos.
Voltando ao seu ponto, os custos de desenvolvimento têm aumentado. Esse é um grande desafio. Precisam ser reduzidos. Você levantou algo interessante: no geral, os jogos não têm refletido o custo total da inflação ao longo dos anos. Então, se você ajustar pela inflação, os jogos não eram muito mais baratos anos atrás.
Ainda assim, há vários fatores que influenciam a decisão de como precificar um game. Outro que você mencionou é o valor geral do entretenimento. Mario Kart World é um jogo totalmente diferente. Além de todas as diferentes pistas, você também tem um mundo aberto para correr com o “Knockout Tour”, ou pode simplesmente explorar e encontrar amigos, jogar juntos pelo chat do jogo… As horas de entretenimento que as pessoas terão são simplesmente gigantescas.
Mas eu também entendo que quando se atinge novas barreiras, quando se atinge novos níveis de preço, você recebe esse tipo de reação. Muito se fala sobre o próximo GTA que será lançado e surgem perguntas como “ok, mas quanto vai custar?” Acho que esse é um desafio da indústria: como recuperar o investimento de todos esses custos de desenvolvimento?
TGE: Houve quem dissesse que a Nintendo estava “tímida” sobre o lançamento do Switch 2 no Brasil, e que isso seria indicativo de uma falta de otimismo. Mas você veio para cá só para isso.
Van Zyll: Não, não! Eu estou muito otimista! De novo, fizemos as pré-vendas e esgotamos os produtos em poucas horas. Os primeiros indícios são extremamente positivos no Brasil, então, estou bastante otimista.
Ao mesmo tempo, eu entendo que isso não é uma simples corrida. É uma maratona. O que estamos vendo e comemorando aqui hoje… não aconteceu da noite para o dia. Levou anos.
É um grande evento, um grande momento, e até agora os resultados superaram nossas expectativas devido à rapidez com que vendemos. E vamos seguir em frente e construir. Estamos muito felizes com o progresso que fizemos com o Switch 1. E estamos otimistas, e eu diria até muito otimistas em relação ao Switch 2.
Então, essa é a nossa visão sobre o Brasil, ou não estaríamos aqui agora. Eu estaria em outro lugar, cara! [risos]