Já faz bastante tempo que trabalho com jornalismo. Com games, há mais tempo ainda. E desde sempre, viajar para jogar tem sido um dos principais motivos (se não o maior) para eu continuar insistindo nesse negócio.
Por sorte, as oportunidades continuam aparecendo. A convite da Ubisoft, visitei a (o?) Summer Game Fest na semana passada, credenciado como repórter especial do The Gaming Era. Contando desde o ano 2000, este foi o meu décimo sétimo evento de games em Los Angeles nos meses de maio e junho.
Claro, isso levando em conta as quinze vezes em que visitei a Electronic Entertainment Expo, a famosa E3. Já no Summer Game Fest, que existe desde 2020, eu compareci duas vezes.
É inevitável comparar os dois eventos, ainda que na prática sejam incomparáveis.
A E3 carregava a responsabilidade de ser o epicentro global dos videogames por uma semana. Todas as principais empresas se faziam presentes, as novidades se concentravam naquele curto espaço de tempo, as oportunidades eram imensas e inéditas: não apenas jogar produtos com antecedência, mas conversar com os principais cabeças da indústria, além de interagir com nossos pares, jornalistas especializados de todas as partes do mundo, com objetivos e ideais semelhantes.
Sem contar as festinhas. Ah, as festinhas.
A Summer Game Fest é até parecida com isso. Mas, ao mesmo tempo, não é nada disso. Para começar, várias das grandes marcas preferem não estar lá. A Nintendo foi uma ausência sentida, mas não a única (estou procurando a área da Sony até agora).
Tudo é mais econômico, mais discreto, menos impactante. A cidade mal percebe que algo está rolando. É o oposto do que acontecia na época da E3.
Naqueles bons tempos, centralizar tudo no icônico LA Convention Center fazia a diferença para chamar a atenção. As dezenas de milhares de visitantes se espalhavam pelas ruas, lojas, táxis e restaurantes. As propagandas dos jogos ocupavam os edifícios. Durante vários anos da primeira década do século XXI, a cidade dos anjos se acostumou a viver, sentir e respirar a E3.
No quesito experiência, o SGF é um evento contido até mesmo para os padrões brasileiros. Na área fechada destinada ao “Play Days”, escondida em um quarteirão pouco atrativo de Downtown LA, as empresas economizam na produção de seus estandes, porque não é o tipo de evento em que chamar a atenção faz alguma diferença.
A premissa é ser enxuto e eficaz para a imprensa, então as publishers investem de acordo com o tamanho de suas intenções e gastam o que podem (e não deve ser barato).
A Amazon Games ocupou o mesmo espaço de 2023, com um enorme bar central que povoou com telas ao redor. A Devolver, sempre criativa, bolou uma área semelhante a uma pracinha, com direito a mesas de piquenique, gramado falso e um carrinho de churros. O espaço da Bandai Namco era todo escuro e invisível para quem estava de fora. A Netflix simulou uma casinha de campo quase disfarçada (tive de perguntar onde era, porque não consegui encontrar sozinho).
Não parece que descrevi um parque temático? Pois era essa a sensação enquanto eu circulava pelo Play Days.
E se falhei em tirar fotos apropriadas, é porque estava sempre correndo, atrasado entre um compromisso e outro. Isso é típico desse tipo de evento e não vai mudar nunca. Vale dizer que havia comida e bebida à vontade em todos os estandes e também na sala de mídia, que também funcionava como um bar, com pufes, mesinhas e Wi-Fi veloz.
A premissa do SGF é ser justamente o que o nome dá a entender: um festival de verão movido a games. Um ambiente relaxante para curtir enquanto se trabalha. Não fosse pela correria, daria para aproveitar mais essas andanças de um ponto a outro.
E sempre encontrando algum conhecido no caminho, porque brasileiros não faltaram: fazendo uma continha de padaria, creio que havia mais de duas dezenas de profissionais de veículos diversos, grandes e pequenos. A maioria não bancou a própria viagem e dependeu de convites das publishers para comparecer, o que foi o meu caso.
Lembrando que a real intenção da Ubisoft ao me convidar foi para presenciar seu evento particular, o Ubisoft Forward, que ocorreu a poucos quarteirões do Play Days do SGF. Suas principais atrações, os ambiciosos Star Wars Outlaws e Assassin’s Creed Shadow, foram (com toda razão) alguns dos AAA mais celebrados do evento.
Já a Microsoft, apesar de ter realizado seu tradicional showcase em um teatro lotado, não ofereceu oportunidades para tantos jornalistas jogarem seus diversos anúncios ou entrevistarem executivos (eu fui um desses não privilegiados).
No mais, eu gostei do que vi e experimentei. Sinto que aproveitei melhor esse ano do que em 2023, e apesar de ter jogado bem menos, me surpreendi muito mais. Indies como The Plucky Squire (O Escudeiro Valente), do pequeno estúdio All Possible Futures, me fizeram ter esperanças em vida criativa além da Nintendo, enquanto iniciativas ousadas e empolgantes como Phantom Blade Zero, do obscuro conglomerado S-GAME, mostram que a China não entrou nesse mercado a passeio.
Novos players como protagonistas dão um sopro de ânimo bem-vindo a uma indústria acostumada aos velhos nomes de sempre. E isso é bom.
O SGF vai substituir a E3? Difícil afirmar. Eu pessoalmente acho que não. São conceitos diferentes para tempos diferentes.
A indústria mundial dos videogames, em pleno processo de ressignificação, vai precisar se adaptar nos próximos anos – ainda mais porque os jogadores parecem desejar experiências novas, que não passam necessariamente pelos jogos AAA de publishers tradicionais em consoles de última geração.
O futuro promete… mas ninguém se atreve a cravar para onde ele vai.