O ano de 2024 terminou com uma notícia que chacoalhou o mercado de desenvolvimento de games independente no Brasil: o carioca BitCake Studio recebeu um aporte liderado pela americana Riot Games. Foi a primeira rodada de venture capital já obtida pela empresa, fundada em 2013 na capital do Rio de Janeiro.
Participaram do negócio (cujo valor não foi divulgado) o fundo de investimento 1Up, um dos mais ativos VCs para o mercado global de jogos eletrônicos do mundo, além de Tips Out, cofundador da OTK Media, e a aceleradora estoniana GameFounders. A notícia foi comemorada pelo mercado brasileiro no apagar das luzes do ano passado, mas também gerou dúvidas: o que levou a Riot, que raramente aposta em jogos que não sejam os seus próprios, a investir no estúdio carioca?
A empresa, aliás, fechou sua divisão de publicação de jogos de terceiros, chamada Riot Forge, em janeiro de 2024, após um lay-off que afetou cerca de 530 pessoas. Era a unidade de negócios responsável por coordenar o trabalho de estúdios em games relacionados ao universo de League of Legends, incluindo o RPG de turnos Ruined King e o adventure Song of Nunu.
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Em resposta à época ao IGN Brasil, Jake Perlman-Garr, diretor de desenvolvimento corporativo da Riot Games, disse à repórter Maria Eduarda Cury que a razão é que o BitCake está “criando experiências novas e inovadoras”. E que a empresa americana pretende “apoiar este estúdio brasileiro e assistir ao seu crescimento”. O diretor é responsável pela estrutura de investimento e aquisições da dona de Valorant.
O BitCake Studio é criador de alguns dos títulos brasileiros independentes mais aguardados dos últimos anos. Ficou conhecido por ter criado Holodrive, shooter de plataforma multiplayer lançado em 2021 com distribuição da Versus Evil.
Tem atualmente dois títulos na esteira: Atomic Picnic, o maior projeto da história do estúdio, distribuído pela Mad Mushroom e em acesso antecipado no Steam; e Neko Neko Rampage, ainda sem distribuidora. Ambos são jogos multiplayer cooperativos, gênero pelo qual o estúdio é lembrado e pelo qual faz questão de ser cada vez mais conhecido.
Em entrevista exclusiva concedida por e-mail ao The Gaming Era, a CEO do BitCake Studio, Camilla Slotfeldt, disse estar “muito empolgada” com o investimento, e explicou que o dinheiro servirá principalmente para o crescimento do estúdio. “Vamos expandir nossa equipe, aprimorar processos internos e explorar oportunidades de negócios”, explicou.
Confira a seguir a entrevista completa:
The Gaming Era: Qual foi o valor do investimento da Riot no BitCake? Pode revelar?
Camilla Slotfeldt: Infelizmente o valor do investimento é confidencial e não podemos divulgá-lo. Essa informação é restrita às empresas envolvidas na rodada.
TGE: E qual foi o modelo? Incluiu compra de que parcela de participação?
Camilla: Sim, o investimento foi realizado por meio de um modelo de venture capital, round padrão, com compra de equity. Também não podemos revelar os valores envolvidos na transação, mas foi uma compra minoritária na BitCake.
TGE: Como o dinheiro será usado? Haverá foco em algum projeto específico?
Camilla: O investimento será fundamental para acelerar o crescimento do estúdio. Vamos expandir nossa equipe, aprimorar processos internos e explorar oportunidades de negócios. Graças ao aporte que recebemos, teremos segurança financeira para poder crescer com um pouco de folga e sem tanto risco.
A maioria dos estúdios indie está sempre tendo que se preocupar com sobrevivência, muitas vezes vivendo mês após mês. Nós valorizamos muito sermos um estúdio sustentável e tentamos ao máximo manter isso.
TGE: Como surgiu essa oportunidade de investimento? A Riot procurou o BitCake ou foi o contrário?
Camilla: O investimento foi resultado de uma conversa que começou na Game Developers Conferente de 2023. Conheci o time de investimentos da Riot durante o evento THE MIX, onde apresentamos o Atomic Picnic, nosso maior jogo até agora.
Naquela época, o jogo era apenas um protótipo, e tínhamos acabado de lançar uma demo na Steam para coletar feedback dos jogadores. O time da Riot jogou no evento e disse que achou um dos projetos mais interessantes que haviam experimentado na GDC daquele ano.
Mantivemos contato e então sugerimos o investimento como forma de alavancar nosso crescimento. Nossos interesses se alinharam perfeitamente.
TGE: Além da Riot, houve participação de outros parceiros como a 1UP. Como eles contribuirão?
Camilla: Além da Riot, nossos principais investidores foram a 1Up Ventures, criada por Ed Fries (ex-Microsoft) e Kelly Wallick (ex-Indie Megabooth), um dos fundos mais interessantes para estúdios independentes. Estamos muito felizes com o apoio deles, pois têm uma abordagem focada em criar uma comunidade colaborativa entre os estúdios em que investem.
Essa troca de experiências é extremamente produtiva, e algo que sentimos muita falta na indústria de jogos. Criar um estúdio de jogos envolve lidar com muitos desafios sem soluções prontas, especialmente no Brasil, onde há poucas referências de empresas que enfrentaram questões semelhantes.
Sempre buscamos ajuda de outros empreendedores, tanto brasileiros quanto internacionais, e acreditamos que a comunidade da 1Up pode ajudar muito nessa nova fase.
O round também contou com a participação da GameFounders, nossos primeiros investidores, e do streamer e empreendedor Tips Out, CEO da OTK Network e da Mad Mushroom. A continuidade dessas parcerias reforça nossas relações e nos dá mais confiança no futuro.
TGE: E quais são as expectativas do BitCake Studio a partir de agora?
Camilla: Nosso grande objetivo é nos tornarmos um estúdio reconhecido internacionalmente por criar os melhores jogos multiplayer para se jogar com amigos online.
O investimento da Riot será essencial para continuarmos evoluindo o Atomic Picnic e, se tudo der certo, iniciar um projeto maior.
Com esse aporte, vamos nos tornar mais ágeis tanto na criação quanto na atualização de jogos e na construção de comunidades ao redor deles. Queremos nos especializar em live services, para poder proporcionar a melhor experiência multiplayer possível para os jogadores. A colaboração com nossos investidores vai ser fundamental para atingir essas metas.
TGE: Você confirmou que a equipe vai crescer. Essas contratações serão todas no Brasil ou no exterior?
Camilla: Sim, planejamos crescer ao longo do ano com algumas contratações estratégicas. Nosso foco principal será contratar talentos no Brasil, onde toda a nossa equipe está atualmente concentrada.
Como trabalhamos de forma totalmente remota, também estamos abertos a contratar brasileiros que estejam vivendo ou passando um período no exterior.